O tráfico de pessoas se caracteriza quando há força ou consentimento induzido decorrente de ameaça, coação, fraude, engano, abuso de autoridade, sendo que muitos casos estão relacionados à situação de vulnerabilidade da pessoa que é envolvida e levada a acreditar em benefícios, mas que obrigadas a deslocar-se para trabalhar (o deslocamento pode dar-se dentro ou fora do país de origem) são enganadas em relação ao pagamento ou às condições de trabalho a que estarão submetidas.
Dados do Brasil são pouco precisos, mas a Organização Internacional do Trabalho (OIT) estima que 250 mil pessoas são vítimas do tráfico humano nos países da América Latina.
Dessas, 2,4 milhões de pessoas vítimas do tráfico humano, pelo menos 44% são vítimas de exploração sexual; 32% são exploradas para trabalhar e 25% sofrem com a combinação de ambos os tipos de exploração. Ainda segundo a OIT, pelo menos metade são menores de 18 anos.
Segundo a ONU, 80% das vítimas do tráfico de seres humanos são mulheres. O estudo aponta que cinco mil mulheres estão forçadas à prostituição apenas em Portugal. Uma pesquisa da principal universidade do país, a Universidade de Coimbra, afirma que 80% delas são brasileiras.
A Rota do tráfico de pessoas
Dados da ONU divulgados no ano passado, contam que as vítimas do tráfico de seres humanos, homens e mulheres de todas as idades, são de 127 nacionalidades distintas, em 137 países. A organização diz ainda que entre 600 mil e 800 mil pessoas são traficadas por fronteiras internacionais a cada ano.
A Pestraf, pesquisa feita no Brasil sobre Tráfico de Mulheres, Crianças e Adolescente para fins de Exploração Sexual Comercial, identificou 241 rotas de tráfico de pessoas que passam pelo Brasil: 110 rotas de tráfico interno (78 rotas interestaduais e 32 intermunicipais) e 131 rotas de tráfico internacional.
As rotas intermunicipais e interestaduais servem de conexão com as fronteiras da América do Sul. São utilizadas especialmente no tráfico de adolescentes e crianças, que depois deixam a região em aviões, navios ou pequenas embarcações.
Segundo a pesquisa, o principal destino das brasileiras é a Espanha. A pesquisa identificou pelo menos 32 rotas de tráfico entre os dois países. Localizando até uma organização conhecida como "Conexão Ibérica", que teria ligações com a máfia russa, sendo a responsável pela maioria dos transportes ao país europeu.
Depois da Espanha, os países que mais têm rotas de tráfico com o Brasil são: Holanda (11), Venezuela (10), Itália (9), Portugal (8), Paraguai (7), suíça (6), EUA (5), Alemanha (5), Suriname (5). A precarização da força de trabalho e a construção social de subalternidade são, segundo a Pestraf, as principais razões para que mulheres sejam vítimas desse tipo de violência. (Adital, 27/09/2007). Na realidade, o fenômeno está ligado à completa falta de organização política e sindical nestas camadas mais exploradas da população.
Legislação
A primeira lei contra a exploração sexual de crianças e o tráfico de mulheres completa 95 anos nesta terça-feira (07). A chamada Lei Palácios, da Argentina, foi o marco que deu origem ao Dia Internacional contra a Exploração Sexual e o Tráfico de Mulheres e Crianças. A lei entrou em vigor em 23 de setembro de 1913. Desde então surgiram diversas outras leis, acordos internacionais e normas constitucionais em diversos países. (Agência Câmara, 06/09/2008)
Para a antropóloga Adriana Piscitelli (Pagu/Unicamp) a dificuldade a respeito do tráfico de pessoas no Brasil é devido a uma “discrepância entre o modo como o Código Penal pensa o tráfico internacional de pessoas – que é basicamente a facilitação para a prostituição no exterior ou, ao contrário, facilitar que alguém do exterior venha se prostituir no Brasil – e a formulação do protocolo de Palermo, que pensa o tráfico de pessoas como o processo de deslocamento e recepção destas sob condições de fraude, coerção e abuso de condição de vulnerabilidade, para serem exploradas em qualquer atividade no exterior”. (sítio da CLAM – Centro Latino Americano em Sexualidade e Direitos Humanos).
O protocolo de Palermo e uma lei internacional que estabelece “Convenção Internacional sobre a Proteção dos Direitos de Todos os Trabalhadores Migrantes e dos Membros das suas Famílias", como forma de garantir os direitos fundamentais dos migrantes, estejam eles legais ou ilegais. O protocolo foi ratificado por 94 países, inclusive o Brasil.
Porém, é importante ressaltar que as conhecidas convenções e leis internacionais, existem para os governos capitalistas, especialmente os imperialistas (que estão a frente e controlam a ONU,) fazerem média e se dizerem preocupados diante das calamidades que a humanidade enfrenta resultantes das próprias características desenvolvimento capitalista, regime de extrema exploração e opressão.
Mais importante que tais leis é, portanto, denunciar e organizar uma verdadeira luta contra os mecanismos que levam e possibilitam a existência de tamanha anomalia como o tráfico de seres humanos. Mecanismos como as políticas de contenção à migração (vale lembrar a quantidade de brasileiros, maioria de mulheres, extraditadas de países como a Espanha), o tratamento e as condições desiguais para o trabalho desempenhado por mulheres, a pobreza, os salários miseráveis, a falta de oportunidades e possibilidades para um pleno de desenvolvimento humano, intelectual etc.
Mulher: objeto para exploração sexual e lucro
A exploração resultante do tráfico acontece através da submissão a serviços forçados em condições que não deixam nada a desejar ao vergonhoso tráfico de escravos negros que movimentou a economia mundial no século XVI.
Agora, em pleno séc. XXI, a característica racial prevalece, acrescido do fato das vítimas serem mulheres, crianças, adolescentes e também prostitutas que vão para o exterior na esperança de ganhar mais dinheiro.
No Brasil, a história se repete em muitos casos, com mulheres e adolescentes normalmente aliciadas e levadas para o exterior com documentos falsificados e aprisionadas sob ameaças e chantagem, forçadas à exploração sexual ou mão-de-obra escrava.
O perfil das vítimas traçado pela Pestraf identificou mulheres trabalhadoras, que normalmente desempenham serviços domésticos ou no comércio (balconista, garçonete); são mal remuneradas; não têm direitos trabalhistas, ou garantias. Vivem nas periferias das cidades, com todo tipo de carência, inclusive de saneamento. As adolescentes provêm de municípios de baixo desenvolvimento socioeconômico, no interior do país. Muitas já foram vítimas de violência intra-familiar (abuso sexual, estupro, sedução, abandono, negligência). (idem)
As mulheres vítimas do tráfico têm em comum a pobreza familiar, a baixa escolaridade, a falta de perspectivas e oportunidades. São em sua maioria adolescentes e negras. Porém, apesar dessas características, sua nacionalidade (brasileira, latino-americana ou européia, por exemplo) não é o mais determinante. Já que a principal característica dessa cruel realidade é o modo como a prostituição e a exploração sexual foi institucionalizada como mais um modo de exploração capitalista, especialmente tolerada, diante da conivência em manter a mulher sem direitos e garantias, considerada ser humano de segunda categoria.
O combate a esta situação de extrema exploração e opressão está no fortalecimento da luta sindical e política da classe operária, em particular, no seu interior, das mulheres e da sua organização.